sábado, 20 de dezembro de 2008

O Berço do Movimento Batista

Muitos questionam o Movimento "Batista" não por uma questão de discussão teológica ou contradição com as escrituras, mas sim por simplesmente não saberem a origem da Igreja pela qual fazem parte.

Muitos crentes também de outras denominações também não sabem sequer da razão "Batista". Publico então em meu blog este artigo do Pr. Zaqueu no sentido de informar o povo de Deus sobre nossa História e origem.

Seja abençoado com essa leitura que na verdade falar da origem dos Batistas é falar sobre a Liberdade Religiosa.

Abraços

Pr Cristiano Scuciatto
 



 



O BERÇO DO MOVIMENTO BATISTA

Pr. Zaqueu Moreira de Oliveira



Pastor e professor do Seminário Teológico Batista do Norte do Brasil (STBNB)



João Smyth, que tinha formação teológica em Cambridge, foi pastor anglicano entre 1600 e 1603, tornando-se então puritano e, mais tarde, em 1606, separatista. Teve no advogado Tomás Helwys um auxiliar competente na nova igreja separatista por ele iniciada. Com a grande perseguição encetada por Tiago I, e após muita discussão na congregação, houve a resolução de emigrarem para a Holanda, onde havia liberdade para os protestantes adorarem a Deus “de acordo com suas próprias premissas”1. Para a viagem até Amsterdã, que ocorreu entre 1607 e 1608, a ajuda financeira de Tomás Helwys foi fundamental. Ali, Smyth, que era profundo estudioso das línguas originais da Bíblia, concluiu que o batismo infantil não era escriturístico.



“Então chegou à lógica inferência de que o batismo que ele e sua congregação haviam recebido nas igrejas paroquiais da Inglaterra não tinha valor”2. Assim é que, após convencer os membros da congregação, ele e Helwys dissolveram a igreja anterior e iniciaram uma nova igreja pelo batismo. Para isso, Smyth batizou a si mesmo e depois a Helwys, e os dois batizaram os demais componentes do grupo enquanto professavam a sua fé3. Isso ocorreu em 1609.




A pergunta de muitos é: por que não se uniram aos menonitas que existiam em Amsterdã, uma vez que ambos os grupos tinham pontos de vista comuns sobre batismo de crentes? A resposta dada por Helwys mais tarde é que eles não concordavam com a cristologia docética aceita pelos menonitas, nem com sua teoria sucessionista. Assim, diferiam em doutrinas e práticas, de acordo com a consciência de seus líderes. O desejo era reconstruir uma igreja de acordo com os padrões do Novo Testamento, através do batismo de todos os crentes professos.



Até a forma de batismo era secundária, pois inicialmente usaram a afusão e não a imersão.


O “separatismo” de Smyth foi duramente criticado pelos seus adversários, levando-o a voltar atrás e pedir filiação aos menonitas para ele e a maior parte da igreja (32 pessoas). Essa filiação não lhe foi concedida, mas seus seguidores a receberam após sua morte. Um grupo menor permaneceu batista, sob a liderança de Tomás Helwys, que se tornou pastor. Uma séria controvérsia foi desenvolvida entre Smyth e Helwys, quando este acusou seu ex-companheiro de ter blasfemado contra o Espírito Santo, uma vez que duvidou de sua orientação para se batizar e formar a nova igreja7. Por outro lado, Helwys foi criticado pelo fato de ter com ele um grupo tão pequeno. A sua resposta foi citar o texto em Zacarias 4.10: “Quem despreza o dia das coisas pequenas?” Essas palavras proféticas pareciam antever que o pequeno grupo de 10 ou 12 que estava com Helwys se transformaria na denominação batista que, hoje, no mundo inteiro, agrega cerca de 100 milhões de pessoas.


Depois da organização da primeira igreja batista, João Smyth escreveu várias confissões de fé e, em uma delas, em 1612, apresentou o primeiro escrito nos tempos modernos a defender completa liberdade religiosa, afirmando que o magistrado deve deixar que a religião cristã seja livre, de acordo com a consciência de cada um8. Por sua vez, Tomás Helwys também escreveu vários trabalhos e, finalmente, o livro intitulado Breve declaração do mistério da iniqüidade, publicado também em 1612, em que defende liberdade religiosa para todos, mesmo para os tiranos e os católicos romanos.

Ele declarou nesta obra a disposição de retornar para a Inglaterra, pois, segundo ele, cristãos não devem fugir de perseguição, mesmo que tenham de morrer “por Cristo e sua verdade”99. Assim, o grupo retornou e se fixou em Spitafields, nas proximidades de Londres, no mesmo ano de 1612, sendo esta a primeira igreja batista em solo inglês. Em uma das cópias do referido livro, há uma dedicatória ao rei Tiago I, onde Helwys afirma que “o rei é um homem mortal, e não Deus, pelo que não tem poder sobre as almas imortais de seus súditos, para fazer leis e ordenanças para elas e para impor senhores espirituais sobre elas”10. Tal declaração, plenamente de acordo com os ideais de liberdade e democracia dos nossos dias, foi muito ousada na ocasião, a ponto de levá-lo à prisão por quatro anos, onde morreu em 1616.

Essa foi a primeira Igreja Batista da qual há continuidade até os dias presentes.

Assim como os Católicos Romanos, os Puritanos, os Separatistas e mesmo os Menonitas tinham as suas peculiaridades, o grupo que permaneceu com Helwys tinha a sua própria identidade, pelo que passou a ser chamado de batista. Herdou o apego a uma vida santa dos puritanos e o tipo de igreja congregacional dos separatistas. O contato com os menonitas, únicos preservadores da tradição anabatista do século XVI, influenciou a adoção da teologia arminiana, pelo que os membros da igreja passaram a ser chamados de Batistas Gerais ou Arminianos, já que defendiam a expiação universal de Cristo. As confissões de fé dos seus líderes também negam o princípio calvinista da preservação dos salvos, ao mencionarem a possibilidade do crente cair da graça11. O fundamental, contudo, era a convicção de que aquele grupo passou a existir pela providência de Deus para defender a verdade bíblica, mesmo com a própria vida se necessário fosse12, devendo conduzir ao batismo apenas os que crêem, conforme a expressão de Felipe ao eunuco, mordomo de Candace, quando este questionou sobre o que impedia que ele fosse batizado. A resposta foi: “É lícito, se crês de todo o coração” (At 8.37a).

 

 

  1. WHITLEY, W. T. Thomas Helwys of Gray’s Inn and Broxtowe Hal, Nottinghaml. Londres: Kjngsgate Press, s.d., p. 10. Apud OLIVEIRA, Z. M. Liberdade e exclusivismo. Rio de Janeiro: Horizonal; Recife: STBNB Edições, 1997, p. 35.
  2. UNDERWOOD, A. C. A history of the English Baptists. Londres: The Baptist Union of Great Britain and Ireland, 1961, p. 37.
  3. ROBINSON, João. Of religious communion, 1617, p. 48. Apud OLIVEIRA, Liberdade e exclusivismo, p. 37.
  4. HELWYS, Thomas. Declaration of faith of English people remaining in Amsterdam in Holland. 1611, não paginado. Trabalho microfilmado.
  5. Sobre essa curiosidade voltaremos a falar posteriormente.
  6. Ato de alguém batizar a si mesmo.
  7. Conforme Helwys, os menonitas negavam a verdadeira humanidade de Cristo e a doutrina de sucessão. Cf. HELWYS, Thomas. An advertisement or admonition, unto the congregation. 1611, p. 35-36. Trabalho microfilmado. Ver também OLIVEIRA, Z. M. Liberdade e exclusivismo, p. 55-56.
  8. SMYTH, João. Propositions and conclusions concerning true Christian religion. 1612. In: LUMPKIN, William L. Baptist confessions of faith. Chicago, Filadélfia, Los Angeles: Judson Press, 1959, p. 140
  9. HELWYS, Thomas. A short declaration of the mistery of iniquity. Reproduzida em réplica da cópia dedicada por Helwys ao rei Tiago I. Londres: The Kingsghate Press, 1935, p. 212.
  10. HELWYS, Thomas. Dedicatória a Tiago I. Apud OLIVEIRA, Z. M. Liberdade e exclusivismo, Rio de Janeiro: Horizonal; Recife: STBNB Edições, 1997, p. 68.
  11. HELWYS, Thomas. A declaration of faith of English people remaining at Amsterdam in Holland. In: LUMPKIN, William L. Baptist confessions of faith. Chicago, Filadélfia, Los Angeles: Judson Press, 1959, p. 118.
  12. OLIVEIRA, Z. M. Liberdade e exclusivismo, p. 61-62.

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